Verdile : Abel, como você ingressou no mercado financeiro de bolsa?
Abel Duarte : Obrigado por essa honra de falar sobre meu trabalho de todo esses 45 anos no mercado financeiro e uma grande parte no viva voz do pregão, né? Onde eu passei a maior parte da minha vida profissionalmente. Bom ingressei no mercado, principalmente no pregão na oportunidade. Comecei lá pelo Banco Auxiliar isso em 1977 logo e em 1980 fui para o pregão como auxiliar de pregão. Usava aquele jaleco amarelinho e ficava levando as boletas para o operador de pregão na época. Não tinha tanta tecnologia como tem hoje, era um telefone com longo fio e você tinha que ir lá, levar uma boleta para o operador. Se a ordem estivesse dentro ou fora do preço ele ia aguardar para executar a ordem.
Verdile : Como era o dia a dia como operador de bolsa?
Abel Duarte : Logo que eu saí de auxiliar de pregão e passei a ser operador de bolsa, abandonei o jaleco Amarelo. Passei a trabalhar na época de terno de gravata que era muito nostálgico. Você era bem recebido em vários ambiente e como operador de pregão existiam as rodas de diversas empresas que tinha capital aberto para negociar que negociava suas ações. Umas com mais liquidez outras com menos liquidez, então ali nos manifestávamos o desejo da compra ou da venda do investidor, ou seja, negociávamos as ordens e já as executava para o cliente. Tão logo imediatamente já íamos informar a mesa. Naquele tempo não tinha tecnologia que temos hoje, então o investidor só ia saber das operações no final do dia e o financeiro depois de três dias que liquidava. Então não é tudo como hoje, tão fácil. Ao final eu ia buscar o mapa na bolsa para levar para a Corretora para bater o movimento, para ver se estava tudo Ok, nas operações realizadas no pregão. Para você ter uma ideia, era cartão picotado como antigamente a loteria esportiva. Inclusive esse cartão picotado era a boleta de registro da bolsa, que tinha três andares só de computadores! Ficava rodando como um projeto UFO, incrível, né?
Verdile : O que fazia exatamente um operador de bolsa?
Abel Duarte : Então, haviam vários operadores de diversas corretoras no pregão em rodas diferentes, muitos operadores mesmo! Então você imagina né? A loucura que era muitas vezes. Geste que rasgava o paletó, camisa, pois quando tinha um evento de alguma empresa, a roda ficava um negócio com uma sala viva de 70, mas ou 80 pessoas, para lá e para cá, tentando atender os seus clientes. Era uma loucura, mas tinha que ser cavalo de corrida para estar ali! Não era para qualquer um suportar. Nas rodas normalmente se negociavam determinados papéis ou era mercados diferentes, cada roda era uma coisa. Na época tinha o mercado à vista e o mercado de opções. Mercado não tão complexo. Não tinha nem a BMF (Futuros e Commodities). Então logo veio na sequencia esses outros ativos de investimentos. No mercado de opções fiz muito a operação básica, que se usa até hoje, comprar o papel e vender uma CALL (Operação de Financiamento ou Venda coberta). Naquele tempo não tinha nem PUT (Opção de venda)! Diferente de hoje que temos essa defesa para nos garantir de uma eventual queda. Então era muito interessante. Logo depois a tecnologia melhorou um pouquinho. Já tinha um telefone com fio comprido. Também tinha os “pitts”, que eu me lembro até hoje, era uma rodinha. Era quadrada na verdade e até armarinho. Você tinha a boleta do comprador e tinha que levar o telefone, que ao esticar o fio, vira e mexe alguém tropeçava, caía, aquela loucura toda.
Verdile : Como foi sua transição de operador de bolsa para um assessor de investimentos?
Abel Duarte : Só ter um detalhe Verdile, que é muito importante eu te dizer, que nessa oportunidade com tanta falta de tecnologia e mil pessoas no recinto a gente tinha 600 milhões de volume na bolsa. Então para você ver como a tecnologia e a informação vem a garantir hoje o mercado que faz 20 BI a 25 Bi. Hoje quando negocia 18 Bilhões é pouco. E nós trabalhamos com 600 milhões! Então para você ver que era uma época que era mais fácil ter uma uma manipulação no mercado. Porque, a final, um cara grande em determinadas ações, como ocorreram, e alguns nomes que não preciso expor aqui, abusaram injustamente por observarmos muitas vezes essa manipulação.
Minha transição foi meio que obrigatória. Porque eu também peguei época que o pregão físico acabou. Acho que em 1999. Não me recordo o ano exato. Eu tive que subir para mesa. Então para os clientes que fui operador de confiança, dos grandes players, com quem eu ainda trabalho, fui catapultado para ir para a mesa de negociação. Quando fui para mesa, eu fiquei obviamente perdido. Não tinha o conhecimento que tenho hoje. Não era só o comprar e vender. Eu sempre fui um cara rápido. Top das corretoras! Era disputado, mas eu tive buscar mais informações. Sabia que tinha que ler mais e eu tive dificuldade nesse aprendizado. Além disso, mudar meu jeito de me comunicar. Porque sou em cara simples e fui parar na bolsa de valores. E até hoje tenho muitos erros de português. Em determinado momento, eu nunca esqueço, quando subi para mesa e um cara que trabalhava comigo, que inclusive acabou sendo meu sócio, me chamou para um café. Falou para eu o perdoar, mas o Ricardo (nome do sócio à época) disse: “você não pode falar assim com o cliente, você fala muita gíria e sei que é muito rápido. Tem que explicar direitinho!” Num primeiro momento, já arredio eu o levei a mal. Então percebi que esse toque viria me ajudar a ser um cara melhor. Depois com o tempo fui conhecendo outros profissionais. O Alcides A. Neto (atual sócio), um excelente profissional, me ajudou bastante. Principalmente nessa época que eu subi para mesa.
Comecei então a fazer o mercado de aluguel de ações (BTC). Eu fazia na época muito aluguel, meu escritório, que fui sócio, fazíamos um milhão de reais por ano de receita! Isso representava 50% desse mercado. Então isso chamou atenção no mercado. Foi quando ocorreu minha transição para Ágora (Corretora do Bradesco) onde tive meu escritório longevo até vir hoje para CRITERIA na XP Investimentos.
Verdile : Como é o dia a dia de um assessor de investimentos especialista em ações?
Abel Duarte : Você sabe, Verdile, como é. O trabalho começa de madrugada e 6:30 da manhã já mandando para minha lista de transmissão, da base de clientes, hoje seletos 80 clientes, que recebem informações quentes.
Começa pelo mercado asiático. Como estão as commodities, mas principalmente minério de ferro. Além disso a agenda de dados econômicos que vai sair, tanto nos Estados Unidos como aqui no Brasil e formatar uma tendência. Ainda mais importante é ficar ligado nas noticias que vão impactar o mercado. Olha que o mercado abre 9 horas, né? Que começa o mercado futuro da BMF. A gente tem uma ideia do índice do dólar e do juros. Hoje a gente vive muito dos juros (curva de juros à termo). Juros nosso aqui e principalmente o juros americanos, já que nós somos o “rabo do cachorro”.
Então isso tudo acaba influenciando diretamente, mesmo as notícias estando favoráveis para nossa economia, uma situação adversa na economia global acaba afetando a tendência do nosso “mercadão” do dia a dia. Mas muitas vezes também se descola.
Quando a coisa tá bem encaminhada, é receber e enviar ordens para bolsa, mas não apenas isso. Tento sempre atender e fazer o melhor para o cliente, porque o seu patrão é o cliente, correto? A gente tá aqui na XP e Criteria Investimentos, que são os veículos de nossa confiança. Então você recebe a ordem de por exemplo: R$ 10. Às vezes você vai olhar o mercado, e ver se consegue executar por R$9,90 ou R$9,80. Isso já é uma economia que você faz para o cliente e ele, com o passar do tempo, vê que você vai tentando sempre fazer o melhor possível. Você acaba influenciando bastante as decisões do cliente, do que ele acha sobre as empresas, sobre o mercado e tudo. Eu não posso emitir opiniões, afinal. Mas para o cliente, digo : olha compra esse papel vende aquele. Papéis que estão mais interessantes no momento. Isso desde para pagar dividendos ou proventos em geral, ou algum fato que pode influenciar no dia. O que posso auxiliar o cliente e dizer todas essas informações falando a tendência do mercado, mas quem decide, a decisão final mesmo, é sempre do cliente. Você pode tentar, como um agente de investimento, é auxiliá-lo a fazer a melhor escolha possível.
Verdile :Qual a melhor forma para ganhar dinheiro com bolsa de valores hoje em dia?
Abel Duarte : Com a minha experiência, tudo se resume à educação. Você não pode, por exemplo, comprar um papel só porque o papel tá caindo 10% achando que vai melhorar. Lembre-se que você está indo contra o volume de várias instituições. Se estão vendendo, alguma informação relevante têm e você está tentando adivinhar o momento dessa curva de melhora. Pode ser naquele momento você acerte, ou pode cair mais 10%, 20%. Então a melhor coisa hoje em dia é você colocar sempre um recurso que você não vai precisar no curto prazo pensando sempre no longo prazo. Pense em montar uma carteira de dividendos para o longo prazo e faça aquele tipo de operação mais conservadora no mercado que opera. Exemplo : É interessante você comprar um papel e comprar uma PUT, como seguro, que se por acaso a ação cair, você compra mais um pedaço da sua empresa sem ter que colocar dinheiro novo. É muito bacana fazer isso para quem pensa em carregar uma carteira. Sempre pensando numa aposentadoria.
Verdile : Qual conselho daria para um investidor iniciante?
Abel Duarte : Parece até repetitivo. Mas é isso: educação. Procure analisar a empresa que você vai entrar. Não só na bolsa. Existe especulação e obviamente o mercado depende do contexto macroeconômico. A bolsa apresenta mais liquidez com a figura especulador, que muitos reclamam, mas é importante para liquidez no mercado. Como o pequeno investidor vai colocar todo mês lá um pouquinho, é justamente isso: analisar boas empresas. Hoje você tem vários sites para que você veja isso e até sites gratuitos analisar o P/L da empresa, ou seja, em quanto tempo você vai buscar o seu capital investido.
Ser educado: Pois mesmo você analisando as empresas, tudo pode acontecer. Algum fato sistêmico ou setorial, pode alterar todo o balanço macroeconômico e financeiro. É não tem amor na posição! Estopa (STOP- Aceite de perda) e vida que segue. Comece outra posição. Acho que não se pode se prender ao amor e a teimosia. Mude quando necessário. Procurar bons setores é possível e fazem parte da economia na própria bolsa de valores.
Você tem papéis de ações com mais com risco ou mais conservadoras, pode escolher o que você quiser, principalmente sendo um pequeno investidor. Mas minha dica é pegar aquele papel que paga bom dividendo e vai montando uma carteira devagar. Use o setor de energia e já que ninguém vai deixar de usar energia, certo? Acho que é por aí no âmbito estratégico.
Verdile : Você acredita mais no investidor que tem uma estratégia de swing trade ou num investidor que faz mais posição para o longo prazo? Ou mesmo o Day Trader?
Abel Duarte : O que eu vejo no dia a dia é que o homem daytrader acaba perdendo o seu tempo e dinheiro. Deixa de olhar outras coisas. Porque quando opera no daytrade, para comprar ou vender no mesmo dia, se você errar a ponta de entrada, já comprometeu o seu dia todo. Eu acho mais legal swing trade. Que você compra a posição para vender dali uns dias ou semanas. O que eu vi por todos esses anos, é inclusive se se eu tivesse feito lá atrás, hoje eu seria um bilhonario, mas seria apenas: comprar. Vai guardando boas empresas no meio do caminho. Vai comprando. Veio dividendos? Reinveste. E vai aumentando a proposição. Acho que melhor jeito de você montar uma previdência é uma posição buy and hold.
Verdile : Qual estratégia com ações você adota? Onde erra menos?
Abel Duarte : 9 horas da manhã, já estou de olho na China e o que aconteceu com as commodities. Na sequência como estão os juros e nos índices futuros. Fico de olho no dólar e nesse meio tempo não nas oscilações ao longo do dia nesses ativos. Fico de olho nos books de oferta. Com o passar dos anos eu ganhei uma sensibilidade maior de enxergar onde está ocorrendo movimento. Não só olhando a tecnologia, no que está mostrando ali na hora. Porque eu sei que existem vezes em que o cara coloca ordem, mas logo cancela, justamente para pegar as pessoas que vivem olhando pro o book. Então você tem que juntar tudo isso.
Pra ser sincero, sou viciados os mercados futuros e correlação com juros. Então é comprar ou vender. É onde tento errar menos no Day trade.
Acho que todos os grandes erros que eu tive mesmo com esses 40 e poucos anos no mercado é justamente a teimosia. Acho que eu perdi mais com posições, pois mesmo falando o contrário do acabei de falar para vocês, pois afinal eu não analisei as finanças e os fundamentos. Fui de intuição e vendo papel caindo 10% eu vou comprei. No outro dia aquilo vai virando uma bola de neve e você não vai vender. Porque pegou o amor naquilo de um dia volta, e não volta nunca mais. Por exemplo o mercado de varejo que aconteceu com Magazine Luiza (MGLU3), ou que aconteceu com Casas Bahia. Então tem que tomar muito cuidado com essas empresas. Tem que colocar em empresas de commodities que movem o mundo ou de energia, você dilui bastante o risco. Pensando em longo prazo, não adianta ir naquele papel só porque fez IPO e foi lançado na bolsa. Esquece isso e vai no vai no “arroz com feijão”.
Verdile : Poderia nos deixar aqui uma dica final e uma visão sua sobre o futuro dos investimentos em ações?
Abel Duarte: Eu acho que é bem promissor. Infelizmente aqui no Brasil, nem todos têm um conhecimento de finanças ou do mercado e como é gigantesco. Há uma prateleira de todos os tipos de investimentos! No meu tempo, não tinha disso que tem hoje. Mas claro, com conhecimento fica mais fácil. Penso que a bolsa serve pensando sempre a longo prazo e em determinadas empresas, boas e pagadoras de dividendos. Acho que não tem como você perder. É como faço para minha filha: eu monto uma carteirinha para ela. Com os esforços que ela guarda com seu trabalho. Não é para vender amanhã, é para ela vender daqui 10 ou 15 anos. Ou daqui 20 anos quando ela quiser se aposentar pois ela está com 34 anos. Eu acredito no nosso país. E acho que em nossa economia a tendência é crescente, apesar de brigas políticas.
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